22/09/2011

O Frio penetrante do Calor


Com o corpo em chamas o grito soa desesperado, pura loucura, não se vê mais os olhos de um homem. É aquela figura monstruosa que se distorce no movimento perfeito de fogo.




Viva ao calor que nos leva por gerações
nos unido do presente ao passado
das bruxas ao terrorismo
pois quem com ferro feri
com o ferro será ferido.

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Vi uma fogueira ontem e ela tinha cheiro de mulher.
Vi uma bomba cair, o estrondo só não foi maior do que o grito das pessoas.
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Correndo em qualquer direção
mas não existem mais
 direções para serem corridas
o fim está perto
bem mais perto do que ontem
e estará muito mais amanhã
mas vamos sorrir
 porque ainda estamos vivo.




A vida tem que ser louvada com o louvor e com o medo.

O Tribunal de Osíris



Eu vejo Deuses segurando a eternidade
E almas gritando por vida;
A vontade, a vaidade, a vinda e a ida.

Desde aquele Faraó
Eu vi na morte
a sorte de ser humano,
mas só há pouco tempo
vi que nem tento
para encontrar um herói.

Maat, eu rio ao saber
que teu sangue é banquete
para Têmis;
Não temo a tua sala,
a minha tem mais verdades;
Diria no mínimo quarenta e duas...
e nada lhe devo,
se nem de seu coração
sente saudades.
Osíris, já o seu,
será dado a meu Dragão
que troquei por aquele livro velho.

Sabem onde me encontrar,
têm o tempo de sete eternidades,
mas pena da justiça e psicostasia
me serve agora
para escrever esta pequena poesia.

21/09/2011

A Máquina do Mundo



E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa, 
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos 
que era pausado e seco; e aves pairassem 
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.